No enorme salão de mármore do terraço da loja de luxo Daslu, jovens com rostos omitidos caminhavam, com armas nas mãos, por becos escuros contando suas vidas no mundo do tráfico brasileiro.
Quando encerrou-se a projeção de trechos do documentário Falcão - Meninos do Tráfico, do rapper MV Bill e do produtor Celso Athayde, as luzes foram acesas para que todos os presentes, uma mescla surreal de pessoas da “comunidade” e hip-hopers com socialites e jornalistas começassem um debate com MV Bill e o rapper Aliado G, apresentado pela ex-MTV Astrid Fontenelle e mediado pelo editor Paulo Lima.
No final das contas, toda a explanação sobre o que motivou a produção, as dificuldades, o feio e sujo foi ofuscada pelo inevitável e latente. Uma das convidadas pergunta se MV Bill não acha estranho falar sobre chegar em casa e não ter o que comer justo ali, onde serviam-se sanduichinhos bem-recheados.
O rapper contornou a situação dizendo que o documentário deve, sim, ser exibido para os ricos. O pessoal da comunidade está acostumado, pois vive aquela realidade. A classe-média desliga a TV aos domingos tranqüila com o fim de mais um capítulo daquela série com atores anônimos, da qual “qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência”. A platéia do evento é que precisa de ânimo, talvez um pouco de choque - medo também? - para promover mudanças que estão ao seu longo alcance.
Outra convidada, uma moradora da comunidade Coliseu, retruca, contando que Eliana Tranchesi, dona da Daslu, entrou na favela sem seguranças, conheceu barracos, elogiou a limpeza e disse que se tivesse que limpar sua casa sozinha e trabalhar, ela não seria tão limpa como aquela, de madeira e plástico fincados no barro. Pobre, mas limpinha.
Uma senhora de busto balouçante grita, cuspindo Botox, “viva Eliana!”, ao que todos seguem com palmas acaloradas.
Depois disso, não demorou a terminar o debate e começar a circulação dos convidados das promotoras e das supridas pelo suposto tráfico de roupas.
Uma repórter da Globo aborda uma pessoa que está com o livro em mãos e pergunta se tem como comprar alguma coisa na loja depois de ouvir tudo aquilo. “Não, claro que não. Agora é hora de refletir”, diz a moça, agarrada ao exemplar e com as bochechas vermelhas emolduradas por lindos brincos em cascata by Tiffany & Co.
Em seu autógrafo, MV Bill, o Mensageiro da Verdade, consegue, enfim, retomar sua proposta: “Para o Lucas, um abraço do MV Bill, por um Brasil melhor”.
PS: A Daslu, preocupadíssima com o mundo ao seu redor, formou uma parceria no final de 2005 com a ONG CUFA - Central Única das Favelas.
3 comentários:
...hmmm! a pergunta que não quer calar: se a daslu apóia tantas ONGs e está tão preocupada com as pessoas em situação "inferior" porque caralhos meteu a daspu no pau? vai entender...
(desculpa o linguajar! ADOREI o post!) ;)
Parabéns pelo post. E pelo blog - inteligente, culto e divertido. E sensível também. Você deve ser um cara muito bacana. Continue assim!
esse é o lucas que conheco... arroz de noite de autógrafos! ahhaha
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