21 de nov. de 2012

Les émotifs anonymes

“We’ll pull each other down like two people drowning. Our struggling will only make us sink faster. I don’t want to sink, or drown; even with you”

4 de nov. de 2012

A vida em preto e branco

Ela se pôs bonita. Ele disse que viria. Arrumou-se, arrumou-a. Cada item da casa foi disposto como imaginara em suas andanças. Copos trazidos à frente no armário, bibelôs, referências, canções.

Há meses, anos, talvez, não tinham uma ocasião como essa. Ensaios, arremetidas e desandadas tiveram aos montes.

Ela fugiu por um tempo. Funcionou por uns instantes, até que percebeu o corpo entorpecido sem cabeça, que já voltara para o setecentismo. Regressou, à revelia, pela primeira vez. Trouxe junto ao corpo muitas possibilidades, um brinde, votos, temperos. Tudo com seu motivo, tudo com sua hora, tudo para uma virada. Estes ensaios...

A casa, por mais abarrotada de quinquilharias que sempre tenha sido, parecia vazia, ecoava. Agora, não mais. Tudo como na imaginação, batia os pés para os passos da dança que nunca tiveram sob o piso mal encerado da sala. Ela tinha vergonhas e dogmas que a tolhiam. Um peito carregado de vontades e ousadia. Dentro dos olhos, vestidos floridos, rodados, brisa, colo, sons alegres, gramado, cafuné. Não extrapolavam as pálpebras.

Mas ele disse que viria.

Sem voz, informou que não poderia hoje, alguns contratempos e compromissos. Ela dormiu, mantendo a cena intacta. Amanhã.

Assoprou a poeira logo ao levantar, reavivou as flores, tirou a comida dos potes. Permaneceu na poltrona, ao lado do telefone. Eras. As pernas formigaram, esticou-as, estendeu os pés, girou-os. Pequenas pausas para checar os cabelos e o disfarce das olheiras no espelho do hall.

Era quase hora.

Veio. Precisava recolher algumas coisas. Entrou, como se ainda fosse parte, recolheu o que precisava. Ela sorriu amarelada, tentou uma pose, balbuciou miudezas. Disse-lhe para jantar. Ele beliscou uma nesga do frango, com as mãos.

Sua vida seguiu. O que era e o que não era já não se saberia detectar. Não sumiu, mas gostava de estar longe. Dizia coisas, vivia outras, imagina-se o que mais.

Uma buzina entra pela janela, para recolher tudo aquilo. A novidade o esperava, impaciente, para seguirem a vida. Apanhou mais um ou dois itens, o embrulhinho que ela entregara no início, deixado sobre o bufê. Fechou a porta logo ao passar. Ela não tinha um olho mágico.

Não é possível precisar quanto tempo ela permaneceu estática, em pé, com assombrados olhos. Destemperada.

Recolheu a comida. Abriu uma bebida, não estava tão doce e colorida como onde a experimentou pela primeira vez, no onírico quebrar de pequenas ondas do mar nos degraus da praça. Parecia a última pessoa da terra, como naquele quadro. Concentrou forças para dar um passo fora, pensou. O que conseguiu foi resgatar uma velha fita e pô-la para tocar. Françoise Hardy, Tous les garcons et les filles. Sorriu, constrangida. Fez sentido. Vagarosamente fechou os olhos, com força. Afastou os braços alguns centímetros do corpo, tombou alguns outros centímetros a cabeça para a esquerda, lembrou do videoclipe, do vai e vem do barco viking com as mãos nos bolsos, as saias, a roda-gigante, a cidade.

Ela sabia aquilo tudo. Dormiu com a esperança de não desmanchar o penteado.

Two Human Beings: The Lonely Ones, Edvard Munch























--

A temple, the higher law.

8 de out. de 2012

Relendo "Amor Líquido", de Zygmunt Bauman

Este post, com excertos desorganizados que copiei enquanto relia, é dedicado, parafraseando o livro, “aos riscos e ansiedades de se viver junto, e separado, em nosso líquido mundo moderno”.

--

"Em nosso mundo de furiosa “individualização”, os relacionamentos são bênçãos ambíguas. Oscilam entre o sonho e o pesadelo, e não há como determinar quando um se transforma no outro.

E assim é numa cultura consumista como a nossa, que favorece o produto pronto para uso imediato, o prazer passageiro, a satisfação instantânea, resultados que não exijam esforços prolongados, receitas testadas, garantias de seguro total e devolução do dinheiro.

Sem humildade e coragem não há amor. Essas duas qualidades são exigidas, em escalas enormes e contínuas, quando se ingressa numa terra inexplorada e não-mapeada. E é a esse território que o amor conduz ao se instalar entre dois ou mais seres humanos.

"Estar num relacionamento" significa muita dor de cabeça, mas sobretudo uma incerteza permanente. Você nunca poderá estar plena e verdadeiramente seguro daquilo que faz — ou de ter feito a coisa certa ou no momento preciso.

Você busca o relacionamento na expectativa de mitigar a insegurança que infestou sua solidão; mas o tratamento só fez expandir os sintomas, e agora você talvez se sinta mais inseguro do que antes, ainda que essa "nova e agravada" insegurança provenha de outras paragens.

Quando se sentem inseguros, os amantes tendem a se portar de modo não construtivo, seja tentando agradar ou controlar, talvez até agredindo fisicamente — o que provavelmente afastará o outro ainda mais. Quando a insegurança sobe a bordo, perde-se a confiança, a ponderação e a estabilidade da navegação. À deriva, a frágil balsa do relacionamento oscila entre as duas rochas nas quais muitas parcerias esbarram: a submissão e o poder absolutos, a aceitação humilde e a conquista arrogante, destruindo a própria autonomia e sufocando a do parceiro.

--

Nós pertencemos ao fluxo constante de palavras e sentenças inconclusas (abreviadas, truncadas para acelerar a circulação). Pertencemos à conversa, não àquilo sobre o que se conversa.

A introspecção é substituída por uma interação frenética e frívola que revela nossos segredos mais profundos juntamente com nossas listas de compras. (...) Se você interromper a conversa, está fora. O silêncio equivale à exclusão. De fato, 11 n'y a pas dehors du texte — não há nada fora do texto.

Para cada ganho há uma perda. Para cada realização, um preço. Não importam o horror e a repulsa com que recordamos ou evocamos os preços pagos e as perdas sofridas no passado — as perdas suportadas hoje e os preços a serem pagos amanhã são os que mais incomodam e magoam. Não há sentido em comparar os sofrimentos do passado e do presente, tentando descobrir qual deles é menos suportável. Cada angústia fere e atormenta no seu próprio tempo.

Quando a qualidade o decepciona, você procura a salvação na quantidade. Quando a duração não está disponível, é a rapidez da mudança que pode redimi-lo.

É absolutamente improvável chegar ao fim de seu catálogo portátil ou digitar todas as mensagens possíveis. Há sempre mais conexões para serem usadas — e assim não tem grande importância quantas delas se tenham mostrado frágeis e passíveis de ruptura.

Dentro da rede, você pode sempre correr em busca de abrigo quando a multidão à sua volta ficar delirante demais para o seu gosto.

Aos que se mantêm à parte, os celulares permitem permanecer em contato. Aos que permanecem em contato, os celulares permitem manter-se à parte...

O fracasso no relacionamento é muito freqüentemente um fracasso na comunicação."

1 de out. de 2012

Supernova, sem champagne e com macarons murchos

O silêncio é sempre sintomático. Pode ser de constrangimento, alegria não compartilhada, reflexão, luto, repouso, apatia, um infinito de sensações e qualidades. Em mim, agora, é uma mistura de tudo. Gasto grande parte do meu tempo e queimo sinapses vasculhando um universo impalpável e ponderando o que seria mentira, o que seria verdade, o que seria insegurança, em minha vida e na de terceiros. O quanto já não foi tramado esses dias. Aguar na bateia o que é amor, deslumbre, novidade, medo, família, fome, cansaço, memórias, lembranças, saudade... Um acúmulo de pedras brutas.

Impossível conter a explosão. O pavio ardeu durante meses, correndo a terra, desbravando novos espaços, iluminando o redor, correndo, correndo. Chegou até a enorme carga, diminuiu a velocidade, entrou, incendiou, liberou energia sob diversas formas. Impossível conter os estilhaços.

Efervescência nervosa, riso adstringente.

O que tenho a perder, agora, é de vista.

Quebra-cabeça. Somos um mar de pedrinhas emboladas, com potencial para virar uma grande, única e coesa imagem de algo bonito. Mas isso requer trabalho, empenho e dedicação.

Quero uma boa temporada, novas bases comparativas.

--

... Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.


É necessário agora que eu diga que espécie de homem sou. Meu nome, não importa, nem qualquer outro pormenor exterior meu próprio. Devo falar de meu caráter. A constituição inteira de meu espírito é de hesitação e de dúvida. Nada é ou pode ser positivo para mim; todas as coisas oscilam em torno de mim, e, com elas, uma incerteza para comigo mesmo. Tudo para mim é incoerência e mudança. Tudo é mistério e tudo está cheio de significado. Todas as coisas são ‘desconhecidas’, simbólicas do desconhecido. Em conseqüência, o horror, o mistério, o medo por demais inteligente.

FP

21 de ago. de 2012

Das despedidas momentâneas

" (...) Mas porque eu passava o dia ao lado dos meus amigos. Juntos. Ou, como diria um amigo meu, em sueco: 'tillsammans'.

E isso é precioso demais.

O que me consola em grande parte nessa despedida é saber que eu não estou deixando para trás aquilo que me fez mais feliz nesse tempo todo.

Obrigado pela alegria de todos os dias, pelos ppt's de algumas madrugadas, pelos bolos repartidos e por ter a honra de poder aprender a trabalhar ao lado de vocês".

--

 
Despedida de Kristen Wiig do SNL, com Mick Jagger

17 de ago. de 2012

Mesmo que exista outro amor que te faça feliz

Prometi que a próxima coisa que escreveria aqui seria algo feliz, como no começo do blog. Sou bom no humor (mentira, quando muito nos trocadilhos infames). Mas a pauta caiu.

Tenho vontade de, como o Super-Homem, carregar meu irmão em um braço, furar as nuvens e só descer quando tudo estiver em paz aqui no chão. Queria fazer isso para minha mãe não ser obrigada a engolir um menino tão grande para mantê-lo, novamente, seguro em sua barriga.

Com isso, fugir um pouco. Este meu confuso redor.

Frente aos 30, é tempo de não mais culpar a Providência, os reflexos, o passado. Ele, que estou aqui vasculhando para ver se entendo alguma coisa. É tempo de assumir.

Quando ainda moleque, os acordes que precediam “Games, changes and fears...”, na rouquidão suave de Macy Gray, empacotavam os ingênuos romances e seus dias nublados. Até perceber que a sequência dos versos é insolúvel: “When will they go from here, when will they stop”. Eles nunca irão, nunca cessarão. Estão em nós, a quem cabe driblar ou nutri-los.

Você foi a coisa que mais amei na vida – na vida que há –, e com quem, em igual medida, mais errei. Errei achando que tinha justificativas e que era charmoso. Errei para mascarar. Errei porque erraram, por um passado torto. Errei por não saber. Mas amar uma pessoa, depois que a paixão passa, também é entender a hora de desamarrá-la. De deixar ir, ainda que em pequenos passos, em arrepiantes fatias de desapego. E ainda não aprendi tudo. E envelheci. Você me salvou do completo amargor e de me afundar em outro rumo, por isso é e sempre será valoroso. Eu talvez deixe um legado feio, que posso melhorar um mínimo dessa forma.

Você escrevia "eu te amo" em minhas costas, com a ponta dos dedos. Jamais adivinharia se não tivesse dito. A cada toque, agora, busco uma mensagem a ser decifrada.


Amarello Amor from AMARELLO on Vimeo.

13 de jun. de 2012

j. edgar

"Funny how even the dearest face will fade away in time. But most clearly I remember your eyes with a sort of teasing smile in them, and the feeling of that soft spot just northeast of the corner of your mouth"

12 de jun. de 2012

Primeira vez

Pela primeira vez entreguei os rascunhos, sem cópia, sem revisão, junto com minha alma. Pela primeira vez eu talvez tenha sentido tudo aquilo, implodido com todo aquele sentimento, e entregar aqueles papéis só confirma que, na verdade, os originais estão em mim.

Do último filme, em um trecho de espionagem, a ideia de que diz a verdade aquele que é capaz de contar a mesma história repetidas vezes, sem escorregar.

Seriam cinco.

Um milhão de músicas sustentam este post sobre meus alicerces abalados.

1 de mai. de 2012

Sem título

Era o clima do Baile da Ilha fiscal, superlativo, abundante, cheio dos mais diferentes tipos de pessoas. Pretenso. Um pouco de Tabacaria. Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. Hoje os dois mascarados procuram os seus namorados perguntando assim: "quem é você, diga logo, que eu quero saber o seu jogo...". Um pouco de Eclesiastes no ritmo de Byrds. A time to build up, a time to break down, a time to dance, a time to mourn, a time to cast away stones. A time of love, a time of hate, a time of war, a time of peace.

Quando não se sabe mais o que é verdade. Quando sentimentos pregam peças. Quando alguém tão íntimo vira um estranho. Os roteiristas voltaram das férias, depuseram minha pena, ataram minhas mãos e me colocaram sentado em frente a TV. O enredo fervilha. Há dezenas de personagens, não há inocência.

Come chocolates, Pequeno. Porque é chegado o tempo de curar, é chegado o fim da monarquia. Do riso alegre da carolina indo ao chão. Lá fora, amor, uma rosa morreu, uma festa acabou, nosso barco partiu.