7 de ago. de 2024

Freud, explica?

De todas as pessoas ao meu redor, das que foram e das que ainda nem conheci, foi você quem acampou essa noite nos meus sonhos.



25 de jul. de 2024

Terra Altar

Entre o céu e a terra, um inesperado caminho de rios pelo qual navega um povo que tem a força de quem vive do que planta, do que pesca, do que cria, e que carrega a esperança de dias melhores nas palmas das mãos e no cortado de palma. E num sorriso que nenhuma intempérie aplaca.

Pedimos licença. Para entrar em um lugar sagrado é preciso despir-se. Pés descalços para dançar de acordo com o vento que sacode as bandeiras de São João e esculpe rocha que um dia foi mar. Mares, montes, desertos. A vida acontece no movimento, no encontro com o desconhecido. Caminhar por um santuário chamado Chapada Diamantina, uma Bahia suspensa. 

O sagrado está dentro da gente. Gente que carrega a fé na jornada de um dia. Gente que carrega fé na terra arada que tudo dá. Mãe d’água que protege o pantanal, que alimenta o Quilombo. Que traz na rede do pescador a comida que nutre a aldeia. As mãos da cozinheira que preparam a fruta verde como prato principal quando a fome chega fora de hora. Aqui os amanheceres não esperam o tempo de amadurecer. Godó de banana. Palma cortada que enche a cumbuca. Vatapá pra São Cosme & Damião. Ritual embalado em renda que se transforma em oração. 

Da arte rupestre que narra a vida que já estava ali milhares de anos antes dos nossos passos, até os passos de dança dos rituais e do caminhar para semear e colher. Venha com a gente viver a expedição Chapada Diamantina, uma Terra Altar cravada no Nordeste de um Brasil que resiste. Que existe. 

*Uma viagem com Carol Daher, coisa mais linda do mundo!®



25 de out. de 2023

Chicken or pasta?

Esses dias, para tentar aplacar um pouco a ansiedade fugindo da rotina (e me aproximando cada vez mais do Serasa), fui de última hora encontrar um amigo em Salvador. Um pulinho, de quinta à domingo. Os dias estavam nublados, mas iluminados por tranquilidade e sorrisos. Fomos jantar. Surpresa, eram frutos do mar. 

Eu comi bem, Rod comeu o dobro, pois eu não gosto de frutos do mar. Então ele desatou a refletir que, mesmo depois de uns dez anos de amizade, ainda não sabia que eu não gosto de frutos do mar. Quem me apresentou o Rod foi a Malu, um dia em que a convidei pra jantar em casa e ela perguntou se poderia levar um amigo. Trabalhávamos todos na Editora Abril, eu fiz pão de linguiça; éramos jovens, a digestão era boa, o fluxo ainda não trazia o “re” e as veias eram mais abertas que as da América Latina (uma piada “sin grasa”). Aquela noite foi um encontro de três almas perdidas nadando em uma cumbuca. Ele e eu engatamos uma amizade que já viu mais coisas do que nossa kombi filosófica possa imaginar. 

Por falar em filosofia, ele é a parte mais racional da dupla, mas o espírito obsessor paira em ambos e o tanto de aventuras e loucuras que somamos já foge da possibilidade de auditoria para confirmar os números atuais. E as conversas reflexivas atritando o asfalto nas idas e vindas entre Sorocaba, nossa terra natal, e São Paulo, onde moro, sempre me sacodem e engrandecem. 

Ele andou quilômetros à toa - e à pé - comigo enquanto um ex-namorado tirava as coisas de casa após o término. Ele me acolheu na casa dele, na vida dele, estando eu sóbrio ou não. Ele cuida do Costelinha com todo o carinho, ele visita minha mãe e anima os fins de tarde e noites de domingo, nos enchendo de fôlego e fazendo tudo parecer mais leve e divertido.

É um dos amigos mais nômades, um cigano vagando pelo mundo em busca de um acordo entre a luxúria e o afeto. Onde quer que ele esteja, entre as outras inúmeras coisas que me lembram da nossa amizade, toda vez que driblo um tentáculo ou preciso tomar um imenso gole de água para engolir uma ostra eu dou um largo sorriso.

O Rod não sabia que eu não gosto de frutos do mar, mas conhece cada cantinho do emaranhado de sinapses do meu cérebro e cada loucurinha do repique das sístoles e diástoles do meu coração. Ele sabe me abraçar e me fazer feliz. E, afinal, o que seriam das próximas horas e novas histórias de uma boa amizade sem uma pitada do desconhecido e do mistério, não é mesmo?



27 de set. de 2023

O resto é história

Ontem fui ao pré-lançamento do livro “Preconceito: uma história”, escrito por Leandro Karnal e Luiz Estevam e publicado pela Companhia das Letras. Conheci o Leandro nos idos de 1998/99, em uma aula que fui assistir na Unicamp acompanhando meu irmão, então estudante de história. Leandro já tinha uma oratória, uma rapidez de raciocínio e uma capacidade de traçar paralelos e exemplificar situações que tornavam impossível desviar a atenção de sua fala. Depois ele foi orientador do meu irmão no mestrado, no doutarado e o apadrinhou em seu casamento. 

O Luiz Estevam, por sua vez, eu conheci logo que minha mãe me deu à luz; descontando a equipe médica, acho que ele foi a terceira pessoa que conheci no planeta. Ele é meu irmão e foi quem primeiro me acolheu quando sai do armário e me deu a mão para que eu pudesse me entender e enfrentar o mundo para encontrar meu lugar. Mesmo cercado por uma série de privilégios, esse não foi um momento fácil da minha vida. Anos depois, foi muito interessante ver o Leandro também se posicionando sobre ser parte da comunidade LGBTQIAP+. 

Poder pegar em mãos o livro que acompanhei a produção desde 2019 e que aborda um tema tão presente em nossa sociedade e tão urgente foi emocionante: “uma obra que examina os efeitos deletérios do preconceito a partir de sua construção histórica. Se o preconceito é aprendido socialmente, ele pode ser desconstruído – um movimento essencial para que conquistemos uma vida mais harmônica e justa”. 

Obrigado ao Leandro por se debruçar e esmiuçar esse tema para que possamos combatê-lo cada vez mais. Obrigado ao meu irmão, seu pomposo título de professor doutor da Unicamp, sua alma de educador, seu coração sem tamanho e seu abraço acolhedor por ter se proposto a uma desconstrução e me dado o suporte e a força para que eu possa ser quem eu sou e por fomentar esse debate. Eu morro de orgulho! Para quem se interessar: https://www.amazon.com.br/Preconceito-uma-hist%C3%B3ria-Leandro-Karnal/dp/8535935495



3 de mar. de 2023

Vem comigo que no caminho eu explico

Eu não sou uma pessoa que se sente confortável com grandes mudanças, rompimentos, o que o mercado de trabalho graciosamente buscou em língua estrangeira o termo “disrupção” para batizar. Brincava com os amigos e amigas que me ladeiam (peço que guarde esse segredo!) que minha vontade era fundar uma agência chamada “Zona de Conforto”, para quem é competente, gosta do que faz e também aprecia a sensação do conforto e acolhimento similar à do útero materno. 

Hoje, evoluindo com minha formação e minha carreira, também entendo que, no úmido ambiente uterino, seguimos o ritmo frenético das batidas do coração alheio, bem como as variações de humor e hormônios, sendo bombardeados por informações e cobrados a evoluir e “nos formar”, física e emocionalmente, desde que compusemos as primeiras divisões celulares. Já cheios de metas a cumprir e avaliações periódicas. Portanto, há que se encontrar um meio termo, aprender com as experiências, pivotar e evoluir. Reimaginar, recriar, repensar todo novo dia. 

Por isso agradeço ao Pedro Vitor de Melo Alves 🏳️‍🌈, mentor da minha carreira, parceiro nas trincheiras #LGBTQIAP+ e amigo, por ter me indicado e incentivado a fazer o eMBA na Fundação Dom Cabral, que concluí este mês depois de um período de grandes questionamentos, desafios, trocas, aprendizados e, claro, mudanças. Agradeço também a Mastercard e a Sarah Buchwitz por terem me proporcionado essa jornada, aos professores e professoras da FDC, que muitas vezes fizeram patê do meu cérebro, a Vanessa Amaral, Monique e Camila, que seguraram as rédeas da turma 112, aos colegas de turma, a minha mãe, que sempre deu todas as bases e condições pros meus estudos (e muito amor) e ao meu irmão, professor da Unicamp, com uma porção de doutorados e livros publicados, que é meu maior exemplo e esteio. 

Que eu seja um profissional cada vez mais consciente dos meus privilégios, inclusivo e trabalhando para um mundo mais justo e com oportunidades para todas as pessoas. Bora sacudir minha vida e esse planeta pra causar um impacto positivo, efetivo e duradouro.

3 de out. de 2022

A gente, a democracia

Declaração Universal dos Direitos Humanos, por Ruth Rocha e Otávio Roth 

As memórias tandem a ficar meio embaralhadas ao longo dos anos. Fico incerto com relação a lugares e coloco pessoas queridas em lembranças de acontecimentos e situações nas quais elas, na vida real/factual, não estavam.  

No encerramento do domingo do primeiro turno das eleições de 2022 lembrei de minha mãe, no idos de 1980, comigo e com meu irmão no banco traseiro de um Volkswagen, um Voyage branco, se não me engano, buzinando e gritando pelas ruas de Sorocaba, onde nasci, e de São Paulo, a capital do Estado, uma hora longe de onde passei a infância, em tempos de busca pelo direito de votar em eleições diretas e de escolher um governo democrático. 

Nessas viagens de carro minha mãe buzinava e gritava a plenos pulmões e com paixão. Eu não entendia muito bem, mas entrava no clima e entoava também as palavras que reforçavam seu coro. Eu não entendia bem pois minha vida foi cercada de privilégios, mas minha mãe gritava como uma menina que trabalhou desde muito nova, uma mulher que lutava por seus direitos e queria ter sua voz ouvida. Que carregava no banco do passageiro décadas de machismo, patriarcado, meritocracia e repressão. 

Minha mãe morava na mesma cidade e era quase da mesma idade de Alexandre Vannucchi Leme, estudante de Geologia da Universidade de São Paulo, primeiro colocado no vestibular, militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), preso, torturado e morto durante a ditadura militar. 

Mandei um áudio para ela quando o Lula não venceu no primeiro turno, triste e choroso, perguntando sobre esses tempos em que ela nos levava para ver que o mundo precisa que nos posicionemos, com o vento das janelas abertas em nossos rostos, ao que ela me respondeu: “Era época das ‘Diretas já’, a gente queria poder votar em eleições diretas, vocês eram pequenininhos e iam com a mamãe”. 

Hoje, adulto, parte da população LGBTQIA+, eu entendo um pouco mais aquelas viagens de carro com essa mulher tão imensa que é minha mãe, que sempre colocou à frente de suas vontades o direito “da gente”, que sempre pensou no coletivo e fez o possível para passar esse olhar pro meu irmão e pra mim. 

Estamos, agora, buzinando e gritando pela democracia, por nossos direitos, por nossa vida, carregando no banco do passageiro o medo de termos por mais quatro anos um pária social na presidência, dando margem para essa insanidade e agressividade que vivemos nos últimos tempos. “A gente não pode desanimar, precisa ter esperança. Vocês ainda são jovens e podem lutar muito mais do que a mamãe. É a democracia, a gente precisa preservá-la. Você vai sempre ter a sua mãe lutando ao seu lado pelo que ela acredita que é certo, e quero que você e seu irmão também lutem”. É pela gente, mãe, e obrigado por ter me ensinado isso.

18 de abr. de 2021

A química do imponderável

Sempre que vou dar um conselho ou palpite para um dos meus melhores amigos, mais novo do que eu, começo a frase dizendo: “Eu, aqui do futuro...” . Obviamente a diferença de idade não me coloca no futuro, estamos vivendo simultaneamente. Cada um com suas especificidades e seu próprio tempo, mas juntos no calendário. Logo seremos todos mais uma camada geológica na terra.

A diferença de idade não me coloca no futuro nesse cenário, mas os anos de 2021 no calendário gregoriano ou de 5781 no calendário judaico me colocam no futuro para o Lucasof de uns 20 anos atrás. Vez por outra me pego pensando o que ele me perguntaria. E, o mais complicado, o que eu responderia?

Como diria Gabriel Garcia Marquez, eu não venho fazer um discurso ou interferir no seu caminho, afinal, não há caminho, o caminho se faz ao caminhar e eu não quero tirar-lhe a imensidão e a beleza dessa trilha. Aqui, do futuro, posso dizer que as coisas estão indo bem. Loucas. Os carros não voam, mas os aviões estão mais rápidos. Interagimos e conversamos com pequenas telas que carregamos no bolso ou na bolsa e viramos nós mesmos paisagens solitárias de cartões postais chamados selfies. Escrevemos pequenas legendas para preencher um grande vazio, parecido com o que você sente sozinho em São Bernardo do Campo durante a faculdade, e enviamos para o mundo inteiro, sem saber ao certo quem vai receber. Em vez de um selo para poder enviar, esperamos carimbos de aprovação após o envio. Curtiu, amou?

Você virou mesmo um jornalista, trabalhou nas maiores editoras do país, realizou seu sonho naquele icônico prédio à margem do Rio Pinheiros. Hoje constrói novos sonhos trabalhando na bandeira do cartão de crédito. Fique tranquilo, ela também tem se reinventado ultimamente. Alguns dizem que você se casou, outros que só morou junto. Foi uma baita aventura! E tem outras por aí. Você teve - e nós teremos! - grandes e únicos amores.

Sim, você é gay. A mini Beyoncé que tomava conta do seu corpo durante as aulas de piano já nos dava uma pista. Poderia dizer para você Googlar esse nome, Beyoncé, mas também não faria sentido. Você ainda usa a enciclopédia da biblioteca para fazer suas pesquisas. Um dia você vai saber quem ela é e talvez tomem uma limonada juntos. Você vai ler Brecht e, em outros dias, vai usar toda a angústia como força para tentar fazer uma mínima diferença no mundo. O Duda vai abrir caminhos e a mãe vai peitar tudo e todos por você. Aliás, isso vai te livrar de passar um ano servindo o exército. “Do rio que tudo arrasta diz-se que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.”

Você ainda não sabe dançar direito e nem andar de patins. Vai aceitar os cachos do seu cabelo, até que ele vai cansar e começar a cair. Tudo bem, você vai incentivar os cachos de um dos seus melhores amigos e raspar a cabeça durante uma pandemia. Pois é!

Uma a uma, você criou coragem pra pintar as unhas que parou de roer em nome da higiene e de frear a contaminação pelo corona vírus, o da pandemia. Estamos usando máscaras o tempo todo! Veja só se não é um grifo de Fernando Pessoa. Alguns dos seu maiores medos também cruzaram o caminho e você ainda duvida de suas qualidades e competências. No meio disso tudo e de uma jornada com a mãe, você vai tirar forças de várias caixas e gavetas para seguir adiante. A gente chora muito mais hoje em dia, enquanto vê o colágeno pelo retrovisor.

Falando em retrovisor, seus “amigos pra vida toda” viraram boas lembranças pra vida inteira. Ou até onde o cérebro mantiver arquivado. Mas você encontrou uma família pelo caminho, já que a sua oficial nem sempre cabia muito. Você escolheu o nome de uma de suas músicas favoritas para batizar sua cachorra, grande demais pro apartamento em que você vai morar. Ela, Ruby Tuesday, vai se mancomunar com a mãe e se refugiar na chácara. E vem o Costelinha, tão pitico. Eles são grandes companheiros.

As máquinas estão evoluindo e aprendendo, já a humanidade eu não posso confirmar. A gente ainda monta Lego. Digo a gente porque suas sobrinhas gêmeas também gostam! É mais fácil encaixar essas peças do que colocar cada pensamento e cada sentimento em seu devido lugar. Não bata muito a cabeça com isso. Agora chega de eu fazer o que a juventude atual chama de spoiler. Um último palpite: escreva muito, porque as novas gerações não são dadas a “textões”.

Encontre boas maneiras para falar o que pensa e o que sente. Você tem uma mágica que talvez perca pelo caminho. Ou esconda. A gente duvida do ar, mas acredita no vento. Confie na dica do Rugol e banho gelado da sua avó. Engate a marcha e venha tranquilo, porque a areia da ampulheta é macia ao tocar os pés. “A matéria-prima do ar, das rochas e da vida foi e continua sendo forjada pelas pressões gigantescas que existem no coração das maiores estrelas.” Somos todos poeira de estrelas. E eu, aqui do futuro, só existo porque você é uma supernova.
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1 de jul. de 2020

Sobre sermos todos seres humanos

Quando eu era mais novo as pessoas eram mais homogêneas. Não porque o mundo era mais legal ou as coisas eram melhores, mas porque somos pasteurizados. Nossas individualidades são podadas desde cedo, o diferente é excluído. Por isso, a gente cresce aprendendo a ser a beirada. Aprendendo a mimetizar o que é socialmente aceito para driblar os preconceitos. Meninos não podem pentear a boneca. Poxa, isso talvez não gerasse meninos que penteassem suas namoradas com carinho, que aprendessem a demonstrar o amor aos amigos afagando, não batendo? Que entendessem melhor o corpo da mulher? Que respeitassem? As meninas não podem brincar com ferramentas, quando poderiam se divertir mais e abrir caminhos, inclusive profissionais. Não podemos todos jogar futebol juntos?

Somos segregados desde a mais tenra idade, quando ainda estamos abertos para o mundo. Meninos e meninas. Rosa e azul. Do mais alto pro mais baixo. Dos que foram melhor em matemática pros que foram pior. Futebol para eles e vôlei para elas. Saias e shorts. Tênis e sapatilhas. Esse só pode casar com aquela. E assim seguimos, sufocados e silenciados.

Depois disso sofremos demais para entender o que acontece dentro da gente. Para aprendermos a nos aceitar, a nos amar. Daí vem o hábito de soltar as mãos quando vemos um conhecido se aproximando ou quando estamos em mar aberto, não em algum porto seguro. É um reflexo de sobrevivência, pois o nosso redor é tormenta. A gente amealha amigos pelo caminho para compor uma família que nos ampara, aceita, abraça e fortalece. Que nos ama, no meio da trilha de rejeição.

O mais correto talvez não seja seja dizer que a gente cresce, mas sim que a maior parte de nós sobrevive. Sobrevive a um ódio à toa. Ninguém deveria ser obrigado a viver marginal ao amor, a sobreviver a uma raiva descabida. A gente engole o choro e se cobre com uma armadura de arco-íris. A gente apanha e cai. E ouve que certamente apanhou por algum motivo, por ter feito algo. Sim, por ser quem e como sou e não entender porque isso gera tanta recusa em algumas pessoas. Mas, por toda essa vida, a gente aprende a levantar com a cabeça mais erguida e a voz mais alta.

Eu era beirada até acordar da dolorida realidade das calçadas, mesmo em minha bolha de privilégios e padrões. Era festa ao meu redor e me foi imposta uma concussão. E foi o que precisei para elevar minha voz. E para o amor transbordar por essas feridas. Para que eu use o que tenho ao meu alcance para fomentar a mudança e para fortalecer essa causa e as causas com as quais dialogo.

Encerramos ontem o Mês do Orgulho LGBTQIA+ e começamos hoje um novo mês em que não seremos mais beirada, ao longo do qual vamos nos orgulhar ainda mais. Nós somos todos os meses, todos os dias, todas as horas. Do nascer ao pôr do sol. Somos o mundo, somos uma explosão de cores, somos amor. E que abram caminho, porque também somos os cabelos das bonecas e as partidas de futebol, únicos em nossas semelhanças, imensos em nossas singularidades.

Eu sou grato a todos que cruzaram minha vida e me trouxeram até aqui, que são minha família e me possibilitaram ser quem sou. Meu irmão, minha mãe, o Carlão, a Bete, o Dr. Lauro, Gabriel, André Lucas, Vinny, Victor, Johnny, Pomba, Fe Fontes, Mayara, Lemp, Caio, Aline, meu pai, Karen, Raquel, Malu, Rod, Rafa Cescon, Pedro. Obrigado! Eu tenho muito orgulho. De mim, da gente. 

Como disse a atriz Dominique Jackson, “somos todos seres humanos. Trata-se de inclusão e nunca pedirei respeito a nenhum de vocês. Eu demando. Você não vai me dizer que me aceita. Você não vai dizer que me tolera. Você não tem esse poder. Você vai me respeitar por quem eu sou”.

É sobre o amor. E sobre não calar. 🌈

10 de abr. de 2020

Hoje eu quero ser...

...uma ampulheta, para fazer o passar parecer lúdico e só revelar o fim ao deslizar do último grão de areia pela goela de vidro, quando já não há mais tempo.

...uma agulha, para juntar partes, ajudar a tirar farpas, cutucar e causar dor.

...uma Coca-Coca de máquina, um pouco aguada, bem gelada, descendo por uma garganta áspera.

...um relógio, para poder parar de trabalhar sem muitas conseqüências, mas achar que, assim, tenho o poder de controlar as horas e dominar o mundo.

...uma roupa extravagante atravessando uma passarela, sustentada por um corpo esquálido iluminado por flashes.

...um apagão aéreo, para deixar pessoas ilhadas em outros países e testar os limites do ser humano.

...um bobo apaixonado, com tudo a que tenho direito.

...um balão meteorológico, para voar alto e longe e ouvir: "É OVNI!".

...uma bunda, daquelas bem redondas, que parecem ter sido desenhadas com compasso, para ser admirada depois da passagem por cabeças que torcem pescoços.

...o estepe de um carro, para ficar esquecido a maior parte do tempo e virar protagonista nas horas mais chatas.

...o movimento de rotação da Terra, para inverter minha lógica de funcionamento e fazer o dia virar noite.

...um milho de pipoca, que em pouco tempo muda de cor, forma e sabor, mas mantém a essência.

...uma garrafa de vinho vazia ao lado de um grupo sorridente de pessoas ruborizadas, que discutem coisas bobas como se fossem o que de mais importante há no mundo.

...um clássico do cinema europeu, no qual o tempo passa arrastado em preto e branco, com ótima trilha sonora, numa coleção menos acessada que a dos blockbusters e séries.

...uma roda-gigante, com luzes super coloridas, para girar o dia inteiro e nunca ficar zonzo. E vez ou outra flagrar um jovem casalzinho apaixonado.

...um pingüim, para ser uma ave que nada, protagonizar filmes e anda como se estivesse com as calças no tornozelo.

...um bicho preguiça, para passar o dia grudado numa árvore com cara de sono.

...um perfume doce para, em um esbarrão numa calçada, sair grudado em um corpo anônimo.

...uma batedeira, para misturar coisas rapidamente e sem medo.

...o tapete azul do meu banheiro, que não liga para fios de cabelo caídos e os pisões úmidos.

...uma pausa de mil compassos.

16 de out. de 2019

Serendipity

Passamos um ao lado do outro na calçada, focados em nossas telas de celular, entretidos nos aplicativos. Foi bem ali, quase onde a rua da improvável floricultura encontra com a do café. Por dentro, carregávamos inúmeros pontos em comum e interessantes diferenças complementares.

Poderíamos ter trocado olhares, um sorriso tímido de canto de boca, puxado alguma conversa e tomado um drink com bate-papo ali pertinho, no número 168. Mas não estávamos nas telas um do outro. Apenas na calçada. E não levantamos nossas cabeças. Talvez eu tenha sentido seu perfume na brisa leve daquele dia e achado interessante. E isso foi toda a nossa relação, esses foram os sentidos explorados, embora eu tenha me apaixonado por essa ficção.

 

23 de jul. de 2019

Há 50 anos o homem chegava à Lua

Gabriel Garcia Marques foi tema de nossa conversa esses dias. Bem como todos os temas que podem caber em 73 perguntas. E são todos. Todos do mundo que podemos desenhar com as cores que escolhamos ao olhar pela janela de uma nave espacial. E é de Garcia Marques um livro com o título “Viver para contar”. Talvez seja isso que queiramos, a longevidade para as fábulas. Ou talvez apenas queiramos contar para viver.

Contamos muito um ao outro, mas não existimos para sermos contados. Nem em texto, nem em imagem, nem em hyperlink ou hashtag. Não somos. Talvez por isso nos dissolvamos tão facilmente na líquida modernidade. E o que contamos, então, é a verdade? Ou publicamos a ficção e nos escondemos num romance biográfico? Arrependo-me por ter vivido o início e o fim, o miolo vai me perseguir para sempre. Mas eu não venho aqui para dizer um discurso (outro título dele). Talvez venha apenas para dizer que a janela é pequena demais para o tamanho do grito que gostaria de dar.

29 de out. de 2018

Super far

Não consigo definir a sensação de entrar em minha casa e parecer a primeira vez. Ter que reocupar os espaços e redecorar a memória. Mesmo após mais de uma década por aqui, são sensações tão novas, desconhecidas, intensas e desenfreadas que quebram a porteira, derramam. É estranho acompanhar as coisas sumindo aos poucos, assim como no filme “Brilho eterno de uma mente sem lembranças”. Assim como sua risada rouca foi esmaecendo nos últimos tempos. Uma dolorida amnésia consciente.

A oposição entre as partes vazias dos armários, onde antes estavam suas coisas, com alguns objetos que ainda coabitam aquelas paredes é similar ao que se passa dentro de mim. Tento disfarçar, tento recuperar uma rotina antiga, mas não tem adiantado muito.

Sei que ainda vou, por um tempo, me pegar pensando se você está coberto ao dormir. Se vou encontrar um fio dental no ralo do box do banheiro. Se vai gostar da janta, quais seriam os planos para um fim de semana a dois. Não vou mais ter que esperar o cochilo para mudar o canal da TV, saber se você está em casa ou não pelas duas voltas da chave da porta. São coisas tão bobas, mas que se avolumam num tanto! As manhãs, agora, são silêncio sem os imaginários programas de TV na cozinha.

As luzinhas, por todos os cantos da casa, vão passar um tempo apagadas, até que tudo isso irá, aos poucos, arar a terra para que brotem novos planos. As músicas, que usualmente parecem sempre tão bobas, ainda mais para quem vive no dial das notícias, passam a fazer todo o sentido. Parecem plantadas em momentos específicos para nos fazer titubear.

Nos conhecemos à beira do furacão e encaramos o olho como uma calmaria perene. Até que a outra margem do vendaval passou, levando tudo. Eu teimei em não te encaixotar ao primeiro alerta e desdobrei meu coração, que havia guardado no bolso. Foi bom, pois com você eu aprendi que o amor pode ter uma deliciosa rotina. O cachorrinho e eu ainda ficamos olhando para a porta, pensando se algo poderia ter sido diferente. Escolhas e caminhos.

As fases da vida têm seus ritos de passagem. Talvez seja realmente o percurso a fazer a história, não a linha de chegada. Mas a dificuldade em mudar o caminho, em entender o caminhar, é de todo ser humano. A inércia talvez seja, além da física, inerente à nossa inexplicável existência emocional. Ainda que tenhamos caminhado lado a lado, nunca estivemos pisando a mesma terra.

Estou falando demais, né? Armando Antenore escreveu que "há despedidas que não encontram tradução. O que falar diante de um amigo que se muda para bem longe, um amor que morre, um projeto querido que se interrompe? Às vezes, o melhor - o mais preciso e eloquente - é dar adeus em silêncio." Mas eu nunca soube lidar direito com o silêncio.

Shiu! Consegue ouvir? O som de um coração espatifando? “Como cristal em um mundo de vidro”. Como uma sinfonia de infinitos silêncios, até que as cortinas se abaixem, as palmas cessem, a plateia seja trocada. Agora temos nossas vidas espatifadas em diversas telas. Logo mais teremos um quebra-cabeça, uma obra de arte em exibição no Memory Motel, um novo espetáculo.

Das berries eu farei um bolo. Afinal, da dupla, sempre fui o carboidrato.









“The idea that we are so capable of love, but still choose to be toxic.”
Rupi Kaur

4 de out. de 2018

Oh, what about us?

"Trust is the fundamental principle for how we connect, for how we communicate and how we actually make things happen. Today we make thousands and thousands of decisions that involve trust, both in our personal and professional relationships. (…) Sometimes that trust is explicit, but often it’s actually unstated, it’s unspoken. Trust is most often manifested in facial, vocal and gestural cues that we all do. (…) Perhaps, most importantly, we trust people based on our perception of how much they genuinely care. Empathy and emotional intelligence are wright at the core of building trust relationships. And ultimately, we all know that we can’t live or work alongside people we don’t trust and whom don’t trust us back."

(Dr. Rana el Kaliouby's opening keynote at the Affectiva Emotion AI Summit 2018: Trust in AI)

18 de set. de 2018

Felicidade ou satisfação: o que esperar da vida?

(Texto do meu irmão Duda, a.k.a. Luiz Estevam*) 

Chega a impressionar como encontramos infinitas maneiras de complicar nosso cotidiano. Dentre as inúmeras formas de complicar nossa existência, uma que se destaca é o quanto evitamos ser felizes. Você deve estar pensando que o autor do texto enlouqueceu: “Tudo o que as pessoas querem é ser felizes! Como ele diz o contrário?”.

A resposta é óbvia, mas não simples. Em primeiro lugar, temos que tentar definir felicidade, e isso é muito difícil. A maioria de nós associa felicidade a um tempo ou uma coisa fora de nós mesmos. Condicionamos a felicidade.

Para ajudar a dissolver esse engano, vamos pensar juntos. Precisamos distinguir satisfação de felicidade. Satisfação é condição necessária da vida. Tenho sede: se não beber água, morro. Se beber, vivo. Ter um mínimo de satisfação é, portanto, imperativo em nossa vida. Além das necessidades básicas a serem satisfeitas, uma existência digna e confortável – estou falando de bens materiais mesmo – é fundamental. Ter é algo que nos satisfaz. Ao menos momentaneamente.

O problema da satisfação é que ela tende a ser passageira. Tenho um celular que me satisfaz em todas as necessidades (e bizarrices) que um celular pode ter. Mas basta saber que lançaram um modelo melhor (ou que alguém já tem esse aparelho) que uma voz surge em nossa cabeça: estou insatisfeito e quero mais. Essa constante, ou quase constante, sensação de buraco interno só é preenchível pela satisfação de um desejo. Mas essa satisfação é profundamente enganosa. Ela não é felicidade, mas euforia, alegria. Passa rápido. Pulamos de desejo em desejo, buscando o efeito extremante prazeroso e evanescente da satisfação de necessidades muitas vezes criadas por nós mesmos.

Por outro lado, é perfeitamente possível viver sem ser feliz. Um escravo pode ter suas necessidades mínimas satisfeitas, mas nunca será feliz. Pois felicidade implica duas coisas de antemão: liberdade e segurança. Se eu for livre e me sentir seguro, posso começar a entender que felicidade é um estado mais duradouro da existência. Longe dos sorrisos que nunca cessam das tradicionais propagandas de margarina e de viagens. Pense como seria a vida se ela estivesse em modo constante de gargalhada. Como dormir se estou eufórico? Como fruir um bom livro, filme ou episódio de série se estou rindo sem parar?

Aproveitar com intensidade a exuberância criativa da vida não é estar em desequilíbrio o tempo todo, como se buscássemos a próxima dose da droga da felicidade (aliás, há muita gente lucrando com elixires da felicidade por aí...).

Não há sentido na vida que não a de uma existência feliz (livre e segura, lembremos). Ser feliz implica reconhecer que há muito de incontrolável na vida. Mas também que há muito sobre o que podemos ter alguma gerência: nossa individualidade, caráter, escolhas, personalidade. Como nenhum de nós é igual ao outro, o que me deixa genuinamente feliz é algo que é realmente autêntico. Quando busco ser feliz de verdade não há receita.

Resumindo: seja feliz por ser você mesmo, pois a felicidade que funciona para seu vizinho não lhe serve. A felicidade – a real – não está na foto do Instagram, mas em entender por que preciso postar tudo em redes sociais. A felicidade está em acatar que cabe muita tristeza na vida, pois do contrário jamais haveria alegria. Uma vida que por vezes contém tristeza, decepção, frustração, mas em que há reflexão, conhecimento de si e ética, é muito mais plena (portanto feliz!) do que uma vida cheia de coisas e planos que satisfazem, mas que é vazia de sentido.

*LUIZ ESTEVAM DE OLIVEIRA FERNANDES é historiador formado pela Unicamp com pós-doutorado pela University of Texas at Austin. Autor de livros como “Santos Fortes” (com Leandro Karnal; Ed. Rocco). IN Revista Delboni Auriemo V.1 N.16/2018



Happiness from Steve Cutts on Vimeo.

11 de mar. de 2018

Call me by your name...

“We had the stars, you and I. And this is given once only.”

"... if there is pain, nurse it, and if there is a flame, don't snuff it out, don't be brutal with it. Withdrawal can be a terrible thing when it keeps us awake at night, and watching others forget us sooner than we'd want to be forgotten is no better. We rip out so much of ourselves to be cured of things faster than we should that we go bankrupt by the age of thirty and have less to offer each time we start with someone new. But to feel nothing so as not to feel anything — what a waste!”

... and I'll call you by mine.

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7 de mar. de 2018

Uma pedra

- O que às vezes a gente não percebe é que ele está pensando três passos na nossa frente.
- A única coisa que eu consigo notar são os tropeços mais bem pagos da história.

26 de jul. de 2017

O tempo e os valores

- To no Serasa.
- Por que?
- Esqueci de devolver um VHS na locadora.
- Um VHS?!
- Sim.
- Quando isso?
- Em 2001. A dívida está em R$ 5.234,00.
- Talvez esse seja o VHS mais caro da história. Mais que a cópia original de E.T.

15 de mai. de 2017

Fingindo poesia nos projetos da firma

O perfume é um momento de encanto, que desperta sensações, vontades, memórias. Tem tudo a ver com estado de espírito, identidade, como nos preparamos e nos mostramos para o mundo. Pode dar o tom para o cotidiano e nos transportar para lugares distantes.

Por isso Xxxxxx e Vogue convidam um selecionado grupo para um passeio na fábrica da Xxxxxx, um local que exalta a natureza, a inovação, o bem-estar e a sustentabilidade. Uma imensidão de cheiros e sensações que nascem da mistura dos ingredientes, ambientes e gentes.

Emulando o processo de criação de um perfume, os convidados passarão por uma imersão em um ambiente lúdico e sensorial, ao longo do qual encontrarão uma série de experiências que despertarão cada um dos cinco sentidos humanos. Aos moldes de grandes eventos e atrações atuais, como a peça Off Broadway “Sleep no More”, o Museu do Amanhã e Inhotim, utilizaremos as matérias primas, detalhes do processo de feitio, instalações e efeitos que vão estimular o tato, olfato, paladar, audição e visão das pessoas, à exemplo de cada uma das cinco fragrâncias da marca.

Espaços sensoriais
Interação com tecnologia
Gastronomia molecular

Uma noite brilhante como essa também é uma grande oportunidade para compor as celebrações dos 42 anos da Vogue Brasil e receber o seleto mailing de convidados da marca, que terão mais um motivo para aproveitar e se divertir.

Perto do encerramento, teremos um especialista contando um pouco mais sobre a mística dos perfumes, caminhando pelas notas de saída/cabeça, notas de coração/corpo e notas de fundo/base para explicar aos convidados como escolher o perfume ideal para sua personalidade e de acordo com momentos específicos.

Ao final, nada melhor que um grande show com muita música e balanço. Depois de toda essa experiência, INSERIR UM NOME convida todos a dançarem para celebrar a vida. As pessoas sairão de lá tendo seus sonhos e desejos permeados pelos aromas e prontas para grandes momentos.

29 de mar. de 2016

Travesseiro da NASA

Dez anos da ida do Brasil ao espaço! É tempo de comemorar o sucesso da plantação de feijão na estação espacial, simulando o experimento com algodão realizado por todo brasileiro durante o ensino fundamental, e o lançamento do travesseiro do astronauta Marcos Pontes.
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29 de nov. de 2015

Chef's Table - Francis Mallmann

Cozinhar, amar, viver e incendiar:

"I don’t believe in flip and flopping food."

"When you cook with fire it’s much like making love. It could be huge, strong, or it could go very slow in ashes, a little cold. And that’s the beauty of fire. It goes 0 to 10 in strength, and in between 0 and 10 you have all these little peaks and different ways of cooking with it, and its very tender and fragile."

"Love is one of the most difficult things in life, certainly one of the most beautiful ones."

"You don’t grow on a secure path, all of us should conquer in life and it needs a lot of work and it needs a lot of risk."

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