10 de abr. de 2024

Hoje eu quero ser...

...uma ampulheta, para fazer o passar parecer lúdico e só revelar o fim ao deslizar do último grão de areia pela goela de vidro, quando já não há mais tempo.

...uma agulha, para juntar partes, ajudar a tirar farpas, cutucar e causar dor.

...uma Coca-Coca de máquina, um pouco aguada, bem gelada, descendo por uma garganta áspera.

...um relógio, para poder parar de trabalhar sem muitas conseqüências, mas achar que, assim, tenho o poder de controlar as horas e dominar o mundo.

...uma roupa extravagante atravessando uma passarela, sustentada por um corpo esquálido iluminado por flashes.

...um apagão aéreo, para deixar pessoas ilhadas em outros países e testar os limites do ser humano.

...um bobo apaixonado, com tudo a que tenho direito.

...um balão meteorológico, para voar alto e longe e ouvir: "É OVNI!".

...uma bunda, daquelas bem redondas, que parecem ter sido desenhadas com compasso, para ser admirada depois da passagem por cabeças que torcem pescoços.

...o estepe de um carro, para ficar esquecido a maior parte do tempo e virar protagonista nas horas mais chatas.

...o movimento de rotação da Terra, para inverter minha lógica de funcionamento e fazer o dia virar noite.

...um milho de pipoca, que em pouco tempo muda de cor, forma e sabor, mas mantém a essência.

...uma garrafa de vinho vazia ao lado de um grupo sorridente de pessoas ruborizadas, que discutem coisas bobas como se fossem o que de mais importante há no mundo.

...um clássico do cinema europeu, no qual o tempo passa arrastado em preto e branco, com ótima trilha sonora, numa coleção menos acessada que a dos blockbusters e séries.

...uma roda-gigante, com luzes super coloridas, para girar o dia inteiro e nunca ficar zonzo. E vez ou outra flagrar um jovem casalzinho apaixonado.

...um pingüim, para ser uma ave que nada, protagonizar filmes e anda como se estivesse com as calças no tornozelo.

...um bicho preguiça, para passar o dia grudado numa árvore com cara de sono.

...um perfume doce para, em um esbarrão numa calçada, sair grudado em um corpo anônimo.

...uma batedeira, para misturar coisas rapidamente e sem medo.

...o tapete azul do meu banheiro, que não liga para fios de cabelo caídos e os pisões úmidos.

...uma pausa de mil compassos.

Nenhum comentário: