26 de jun. de 2013

A parte mais fácil

O exercício de nos imaginarmos adultos. Tudo parece distante e, honestamente, não tão difícil de alcançar. A folha está em branco e a cabeça explode em traços e cores.

Firmei que aos trinta seria um cara casado, com carro, casa, trabalhando em um determinada empresa. A casa cheia de amigos e isso seria a plenitude. Assim pensava faz uns dez, quinze anos. Tenho a casa, o carro, trabalho nessa empresa; os amigos vêm sempre que as agendas permitem. Tive longos namoros, não me casei. Pulei um monte de etapas do plano inicial, não fiz um monte de coisas, errei bastante. Machuquei bastante. Perdi oportunidades. Viajei pra caramba. Mudei. A parte complexa acontece agora, em que estou entendendo que mudei.

Desdobrei a folha e estou olhando com olhos franzidos. Evoluir em cima dessa mesma? Rabiscar por cima de planos tão honestos e cheios de juventude? Jogar fora e pegar uma nova? "Meet me in Montauk", suspiro.

Sobre mudança e cabelos, uma vez a amiga Adília, com madeixas que concorrem como as mais elegantes do mundo, disse a receita:

"Aos 15, pinte o cabelo de azul e compre uma mochila que combine
Aos 20, esqueça o cabelo e mantenha-o amarrado num rabo de cavalo
Aos 25, faça permanente, para se despedir dos cachos
Aos 30, levante o queixo e solte as madeixas
Aos 35, corte o cabelo bem rente, pinte de cor de cobre, a correria exige coisas práticas
Aos 40, brinque de luzes, faça chapinha hoje, escova amanhã, perca tempo
Aos 45, chanel, para curtir a elegância
Aos 46, na noite de ano-novo, prometa a si mesma que não vai mais pintar o cabelo, raspe a cabeça com máquina 4 e encontre um cabeleireiro que ouse ajudar você a se reinventar…"

Eu acolhi os cachos aos 25 e levantei o queixo aos 30, questionando os fios que branqueiam em velocidade acelerada. É importante nos reinventarmos. Encontrarmos novos significados para partes, despedirmo-nos de outras, fincar algumas decisões. "To everything there is a season and a time to every purpose under heaven". Tudo bem, eu sei que sou um pouco repetitivo com esses versos.

Gostava da música dos Byrds antes mesmo de ter lido Eclesiastes. Nunca fui um menino da Bíblia, sempre fui um cara de fé.

Mas há um tempo em que um homem não é uno. Seus vícios e virtudes estão em descompasso e as mãos agem com intensidade de pés. O mundo perde as referências e, por reflexo, ele reage por acúmulo e explode. Há um tempo de entender. Há um tempo de se arrepender, refazer. Haverá a idade das coisas leves. Haverá a unidade e o amor.

Aos trinta, pegue uma garrafa de vinho, entre no metrô, desça na estação Trocadéro e peça alguém em casamento em frente à Torre Eiffel. Não interessa onde isso vá desaguar, um momento infinito terá sido vivido. Uma nova tatuagem terá sido feita. Um novo desenho adicionado na folha. Nada poderá mudar aquela pausa na existência. Mesmo que seja o tempo de encontrar outros significados e ter uma longa noite de sono para renovar os sonhos até alguma outra idade.

O cabelo, agora, está vermelho. Estou voltando de mais uma viagem. Duas, talvez, já que regresso à Terra depois de alguns dias brincando de Neil Armstrong. If you believe they put a man on the Moon.

Memórias e vontades. A página está cheia de coisas e de espaços.


2 comentários:

dtrocoli disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
dtrocoli disse...

Você sempre terá uma folha nova, só muda o tamanho dela e você tem que prestar mais atenção no uso do espaço :) Mas como vc vai lembrar das outras folhas vai saber escolher como quer usar a folha nova.

Abs,